Porque morrem os atletas? (Parte 2)
Como explicar as autópsias negativas?
Não é invulgar, nos casos de morte súbita cardíaca (MSC) de atletas, a autópsia não indicar qual foi a causa provável morte – 10% a 30% das mortes são classificadas como indeterminadas.
Se nos recordarmos das anomalias cardiovasculares de alto risco mais frequentes nesta população (Parte 1), compreendemos que serão principalmente as doenças doenças eléctricas cardíacas, muitas delas geneticamente determinadas, que não foram diagnosticadas na autópsia. Isso porque hoje em dia, devido ao uso mais generalizado das técnicas de imagem cardíacas (Ressonância Magnética Cardíaca, TAC e Ecocardiografia) podemos afirmar que o diagnóstico feito “em vida” tem muitas vantagens sobre o diagnóstico na autópsia. Repare que, por exemplo, o estudo da atividade elétrica cardíaca (Electrocardiograma, Holter, Estudo Eletrofisiológico…) só é possível realizar em vida.
Ao contrário do que se poderia supor, o estudo genético post mortem deveria ser sempre realizado quando a causa de morte não foi identificada. Em cerca de 1/3 destes casos têm sido encontradas mutações genéticas associadas a doenças potencialmente malignas, tais como nas sindromes do QT Longo e de Brugada e na Taquicardia Ventricular Catecolaminérgica.
Por outro lado, dado que estas doenças são quase sempre herdadas geneticamente, a presença de um resultado positivo na autópsia determina a necessidade de estudos exaustivos nos familiares vivos, na medida em que o risco de transmissão familiar é da ordem de 50%.
Segundo sabemos, no nosso país, a “autopsia molecular” realiza-se em todos os casos de MSC de causa indeterminada (também designada de “causa arrítmica”) no desporto federado e tenderá a generalizar-se a outras situações pelos motivos atrás referidos.
Embora a MSC seja cerca de 2,5 vezes mais frequente no atletas jovens do que nos jovens sedentários (devido ao “efeito de gatilho” do exercício físico intenso na génese de arritmias letais), a Academia Americana de Pediatria aconselha os médicos a examinarem todas as crianças (não apenas jovens atletas de competição) para identificar os sinais alarme da presença de cardiopatias com alto risco de morte, pelo menos de 3 em 3 anos, em particular à entrada dos ciclos escolares médio e superior.
Entre nós, aconselha-se a realização do exame médico desportivo no desporto federado anualmente.
Pontos a reter neste artigo:
• Nos jovens atletas (<35 anos), as mortes são mais comuns devido a anomalias hereditárias e congénitas, incluindo cardiomiopatias, anomalias congénitas das coronárias e doenças dos canais iónicos.
• A triagem com ECG é eficaz para identificar os atletas com problemas cardíacos eléctricos graves e levantar suspeitas de cardiomiopatia.
Prof. Ovídio Costa, cardiologista.
Professor da Faculdade de Medicina da U.P.