CPCJ da Maia tem cerca de 400 sinalizações
O início do século XX ainda era marcado pela falta de proteção especial para crianças e adolescentes. Encontrávamos indivíduos de tenra idade a trabalhar em cenários insalubres e sem segurança, especialmente nos países industrializados. Começa a emergir na sociedade o reconhecimento de que a situação na qual esses indivíduos se encontravam eram injustas e que deveriam receber uma maior proteção, tanto jurídica quanto social.
Como consequência, a Organização Internacional do Trabalho abordou sobre a proteção das crianças no preâmbulo da sua Constituição de 1919, assim como determinou numa das suas primeiras convenções, a delimitação de idade para o trabalho infantil.
Mas foi na década seguinte que os direitos das crianças e dos adolescentes foram de fato conquistados no mundo. Isso ocorreu após a fundação, também em 1919, da organização não governamental Save the Children, que tinha como finalidade auxiliar os órfãos da Primeira Guerra Mundial. A organização foi fundada por iniciativa privada na Inglaterra e foi responsável pela elaboração da Declaração dos Direitos das Crianças de Genebra, adotada pela Liga das Nações no ano de 1924, representando o surgimento dos direitos das crianças e dos adolescentes.
Contudo, com a dissolução da Liga das Nações e o acontecimento da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), em que houve a violação em massa de direitos humanos, a comunidade internacional fundou a Organização das Nações Unidas (ONU) e publicou em 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Mesmo assim, era visto como necessário a elaboração de um documento específico que tratasse sobre os direitos das crianças e adolescentes. Fonte: Instituto Mattos filho
Em 1959, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotava a Declaração dos Direitos das Crianças. Hoje, ao contrário de há 50 anos atrás, as crianças têm vários direitos, entre os quais, direito a serem ouvidas, a dar a sua opinião e devem ser protegidas da violência doméstica.
Mas, apesar desta evolução, com o passar dos anos existiu a necessidade de criar instituições que defendessem os direitos das crianças e dos jovens, assim como prevenir situações suscetíveis de afetar a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral, tendo como base, vários indicadores de risco:
Se a criança está abandonada ou vive entregue a si própria;
Se sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais;
Se não recebe os cuidados ou a afeição adequada à sua idade e situação pessoal;
Se está ao cuidado de terceiros;
Se é obrigada a atividade ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade;
Se está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional;
Se assume comportamentos ou se entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento.
Assim, em 2001, numa relação de parceria com o Estado, surgiram as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ).
Comissão de Proteção de Crianças e Jovens da Maia tem cerca de 400 sinalizações
De forma a conhecermos melhor o trabalho da CPCJ da Maia, o Maia Hoje teve oportunidade de falar com António Lopes Marinho, presidente desta Comissão.
A funcionar há 26 anos, a CPCJ da Maia vai recebendo muitas sinalizações devido à quantidade de pais e mães que se sentem incapazes de educar os seus filhos e porque, hoje em dia, as crianças são mais exigentes e colocam cada vez mais desafios às Comissões. De acordo com o presidente são vários os pais que contactam a instituição, «chegam aqui em desespero e dizem “eu não sei o que fazer ao meu filho”». Para além dos familiares, a escola também procura a CPCJ, uma vez que «é um local onde muitas das problemáticas surgem, normalmente associadas ao absentismo escolar (…) é muito mais do que faltar às aulas». Para evitar estas situações, as CPCJ existem para «proteger crianças vulneráveis (…) dar-lhes voz para seguirem o seu caminho, de modo adequado, cumprindo o que é expectável para a sua idade».
Mas quem é que pode sinalizar estas crianças que estão em risco e como?
Segundo o presidente da CPCJ da Maia, a sinalização «pode ser efetuada por qualquer pessoa que percecione a existência de perigo ou risco» identificando pormenorizadamente o que viu a acontecer. Há várias formas de fazer uma comunicação, como contactar as autoridades ou as Comissões territoriais, anonimamente ou não. Após serem informadas, as Comissões iniciam o processo de avaliação que visa «avaliar, se de facto, aquela notícia que nos fizeram chegar corresponde ao risco de perigo em que a criança se veja inserida. Durante esse processo, se verificarmos que há perigo, o processo continua até que seja aplicada uma medida. Se verificarmos que não há razão para isso, o processo é arquivado» diz António Lopes Marinho.
De forma a não prejudicar as crianças ou jovens, as Comissões têm um período de seis meses para a avaliação de um caso, no entanto «se é algo crítico, nós vamos dar prioridade» adita o presidente, aproveitando para acrescentar que «dizem que as Comissões retiram crianças, essa medida está tipificada na lei e infelizmente nós temos que a aplicar, mas ela só é aplicada se verificarmos que não há condições, quer da família direta, mas também na família alargada». Todas as medidas tomadas pela instituição são trabalhadas com as crianças, com os jovens, com os pais ou com que detenha a guarda legal, ou seja, «é uma instituição garante, qie trabalha em conjunto, e não a tal entidade “que me vem retirar o filho”».
O mundo está mais acelerado que nunca, assim como as pessoas e, hoje em dia, observa-se «a falta de tempo de qualidade para ministrar uma verdadeira educação em casa» refere António Lopes Marinho, acrescentando que «é importante que se tenha presente de que, o ambiente familiar débil, naturalmente, torna a criança/ jovem ainda mais débil».
Quantas sinalizações há na Maia? Quantos processos têm em desenvolvimento?
António Lopes Marinho refere que «há data de hoje andamos por volta dos 400 processos ativos». Um número que preocupa a CPCJ na Maia, uma vez que «é um município que tem uma preocupação muito grande em criar condições e estruturas para que algumas das problemáticas não aconteçam». Apesar do nosso concelho estar bem equipado com espaços verdes, parques infantis e parques para prática de espaço, «os miúdos estão a brincar sozinhos enquanto que os pais estão sentados numa esplanada». Segundo o presidente «curiosamente os estudos indicam-nos que o problema está nos pais e na falta de qualidade de vida pais/ filhos».
Não esqueçamos que a realidade da Europa e os direitos adquiridos, não se refletem em muitos países pelo mundo fora, onde em pleno Século XXI, vemos crianças, jovens (e adultos) a serem mal tratados, sem direitos e sem qualquer defesa do seu ser. Lembremos Albert Einstein ( um dos maiores gênios da humanidade do Séc.XIX) que já dizia “A palavra progresso não terá qualquer sentido enquanto houver crianças infelizes” e Johann Goethe ( escritor e pensador alemão do Séc. XVIII), que refletindo sobre este assunto referia que “Só é possível ensinar uma criança a amar, amando-a.” São verdades universais.