Desafios demográficos em Portugal e na Europa

Desafios demográficos em Portugal e na Europa

Sem adaptação às tendências demográficas atuais, há uma grande chance para prejudicar a economia e a competitividade, o que por sua vez, prejudicará o bem-estar social e a qualidade de vida europeia. Os desafios na garantia atual e futura do estado social, aumentam com a crise democrática para o pensamento a médio prazo.

A Europa é o único continente, e em particular a União Europeia (UE), com um saldo populacional negativo atual e projetado. Aliás, este ano poderá marcar um ponto de viragem na história da UE, em que a sua população de 448 milhões irá começar a diminuir após o número total de nascimentos ter ficado abaixo das expectativas em 2023, apesar da previsão do Eurostat ter apontado apenas para 2026, quando atingisse os 453 milhões de pessoas. Neste contexto, Portugal segue o mesmo padrão e, em comparação com 2000, além do baixo número de nascimentos, também já se encontra numa tendência negativa em relação ao número de pessoas em idade ativa. Neste sentido, importa discutir os fatores que estão a condicionar a baixa natalidade e as implicações de uma elevada esperança de vida no mercado de trabalho e no estado social.

O trajeto e sucessos da natalidade

A taxa de fertilidade da UE caiu para 1,46 em 2022, sendo já reconhecido que a idade mediana em que as mulheres têm o primeiro filho aumentou e o número total de filhos diminuiu. Mas é importante reconhecer que esta diminuição é também um produto de sucesso do desenvolvimento das sociedades europeias, traduzindo-se em mulheres com maiores níveis de escolaridade, maior participação no mercado de trabalho e mais rendimento disponível. No entanto, mesmo entre as mulheres de níveis socioeconómicos mais baixos, que tradicionalmente eram as que tinham crianças em idades mais jovens e em maior número, também têm acompanhado o padrão anteriormente descrito. Por isso mesmo, tem sido discutido que as políticas familiares são importantes no apoio à natalidade, mas incentivos diretos podem criar danos sociais regressivos que devem ser evitados.

O aumento da idade materna no primeiro filho é parcialmente explicado pela prioridade na estabilização das carreiras e relacionamentos, onde o papel das políticas familiares funciona como apoio após a decisão. O número total de filhos é outra história. O período fértil nestas circunstâncias é naturalmente reduzido, mas também é sobretudo influenciado pelas condições sociais e económicas das famílias, e da importância em garantir que as necessidades pessoais, familiares e sociais são satisfeitas. Por isso, os casais tendem a ponderar a ideia de ter 2 ou 3 filhos, número mínimo necessário para a reposição geracional, quando essa decisão pode levar a piores condições de vida.

É importante assumir que a taxa de substituição poderá manter-se baixa se isso significar que a sociedade como um todo está a aumentar o seu bem-estar, à medida que as famílias e, em particular, as mulheres têm melhores níveis de escolaridade e melhores oportunidades e igualdade profissional.

Os desafios de uma elevada esperança de vida

A UE é também o continente com maior esperança de vida à nascença, 80,2 anos para ambos os sexos, em que Portugal se encontra nos lugares cimeiros, e a proporção da população com mais de 65 anos representa 21%, a mais elevada do mundo. As implicações políticas na definição dos períodos de reforma e políticas laborais continuarão a ser altamente desafiantes no contexto atual, em que a sustentabilidade do sistema de pensões e da segurança social é uma das maiores preocupações. Trata-se, também, de uma discussão de justiça intergeracional e de garantia dos direitos sociais das pessoas idosas, sobretudo na abordagem dos cuidados continuados de saúde e sociais, em que Portugal em particular tem um défice de oferta acentuado, com elevada dependência nos cuidados informais.

Por outro lado, a população em idade ativa da UE diminuiu de um pico de 270 milhões em 2011 para cerca de 261 milhões este ano. As implicações para o crescimento económico são óbvias. Embora no geral, a imigração e o aumento das taxas de emprego, especialmente entre as mulheres, cuja participação aumentou quase 10% desde 2009 para 70% em 2023, compensaram até agora o declínio demográfico geral, a maioria das análises mostra que em breve não será suficiente. Além disso, as novas gerações têm uma abordagem diferente ao trabalho, em termos do balanço entre a vida laboral, social e familiar, e como tal espera-se que o total de horas trabalhadas diminua com semanas de trabalho mais curtas, o que significa um menor crescimento da produtividade.

Todos estes fatores significam que uma diminuição da população em idade ativa traduz-se em menos impostos cobrados atualmente, uma taxa de natalidade decrescente significa menos impostos cobrados no futuro e uma percentagem crescente de pessoas com mais de 65 anos numa esperança de vida elevada e em crescimento significa uma procura crescente por serviços sociais e pensões a serem pagas em longos períodos de tempo. Além disso, o atual modelo político-económico está desenhado para aumentar os riscos sociais através da diminuição da esperança de vida saudável e do aumento das externalidades negativas comerciais com impacto nas alterações climáticas, diminuir a taxação dos lucros e da riqueza, e reduzir o retorno fiscal sobre o trabalho por elevada pressão em manter os salários baixos.

Então, o que pode ser feito?

A imigração altamente qualificada pode ajudar a colmatar lacunas fiscais, por exemplo através da atração de talentos globais sobretudo em setores onde a escassez laboral é maior. No entanto, não é uma política sustentável, assim como politicamente continuará um tema controverso e explorado pelos partidos populistas. O estado social precisa também de ser repensado e readaptado. Apoiar a continuidade no mercado de trabalho após o limite legal de reforma (a EU é a que tem a menor taxa de participação quando comparado com a média da OCDE, dos EUA e do Reino Unido) e tornar obrigatório o acesso e contribuição para a segurança social para todos os tipos de regimes de trabalho (neste momento, os regimes tradicionais são cada vez menos frequentes) são algumas soluções.

Por outro lado, o desenvolvimento e adoção de novas tecnologias deve continuar a ser impulsionado, para facilitar a transição demográfica, desencadeando o crescimento da produtividade em toda a economia e apoiando a prestação de cuidados sociais, como os de longa duração para os idosos. Por fim, investir em competências e educação continuará a ser o maior garante do crescimento de uma economia sustentável, de uma sociedade justa e de um nível de qualidade de vida que caracteriza a cultura e padrões europeus e portugueses.

João Paulo Magalhães
Médico e doutorando em políticas europeias

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